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quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Estudo de Casos: Mulher gravida, pobre, roubou para comer.



A desempregada Patrícia Galvão Camelo, de 33 anos, ficou presa por três dias, em uma delegacia de Fortaleza, por tentar roubar uma lata de leite em pó de uma padaria. Grávida de seis meses, ela disse que estava com fome e sem dinheiro para pagar. Ela não chegou a levar o produto e foi presa em flagrante. A grávida só foi libertada anteontem mediante alvará de soltura expedido pela Justiça.
Autônoma, Patrícia não consegue mais trabalho. “Desde que eu fiquei grávida, o pessoal não me dá mais trabalho. Tentei até negociar com eles (os funcionários da padaria) para que eles me dessem esse leite, porque eu poderia chamar um amigo para pagar. Tem tanta gente aí fora que comete tantos crimes, né? E eu com fome, muita fome. Fome de doer meu estômago”, afirmou quando estava presa.
“O que eu queria era poder sair daqui e ir embora para a casa da minha mãe, poder ter esse filho lá. Era só o que eu queria”, disse Patrícia.
Segundo o delegado Antunes Teixeira, apesar de Patrícia não ter passagem pela polícia, ela só poderia ser solta caso pagasse fiança ou por determinação judicial. O próprio delegado providenciou a documentação necessária para que a grávida pudesse deixar a cadeia. Teixeira se baseou no princípio da insignificância penal. “Não compensa ao Estado mover a sua máquina processual para condená-la, porque tudo isso vai custar mil vezes mais que o valor da lata de leite”, explicou
 Na musica “Dias Melhores” do grupo musical Jota Quest há uma esperança de vivermos dias melhores em nossa sociedade. Esses dias talvez ainda não tenha chegado para uma boa parcela da sociedade, especialmente para Patricia Galvão Camelo, a grávida e desempregada de 33 anos que ficou três dias presa por tentar furtar uma lata de leite para saciar a sua fome. O desamparo social vivido por Patricia é só mais entre as diversas mazelas que pipocam nos noticiários da impressa. Economicamente desamparada sem estrutura social e até biológica ( digo isto porque é inconcebível que uma gravida passe fome de doer) de estar esperando um filho ela viveu em meio uma tormento pois além de suas dificuldades encontrou pela frente pessoas desprovidas do minimo de amor ao próximo ou bondade e isso somado à falência das políticas públicas que deveriam amparar a futura mãe e a criança em seu ventre. É incompreensível como o dono do estabelecimento pode promover a denuncia contra ela sem o mínimo de complacência, mais incompreensível ainda é ver que o delegado não obteve ferramenta jurídica para não deixar essa senhora três dia na cadeia (numa análise rápida da lei qualquer leigo verá que o delegado passou do tempo de comunicar ao juiz a prisão e o juiz em conceder liberdade provisória). Isso sem falar na ruína do Estado que não proveu os direitos fundamentais mais especialmente os direito sociais previstos na Constituição Federal: “São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição (CF Artigo 6°). Fica claro que os direitos a saúde (estar gravida e passar fome pode ser agravo a saúde), o trabalho (desempregada), a proteção a maternidade (gestante), a assistência aos desamparados (não tinha dinheiro para pagar o leite), não foram atendidos pela politica pública do Estado.

Percebe-se que há um desmantelamento generalizado na sociedade que cerca Patricia, pois sendo o homem um ser social -segundo Aristóteles- e a sociedade que este homem vive é imprescindível para sua humanização, a desempregada fica totalmente marginalizada na sociedade em que vive e consequentemente desumanizada. O noticiário não menciona mas é notável a ausência do genitor da criança que deveria ao lado de Patricia cuidar do desenvolvimento de seu filho. Como a gravidez pode ser provocada por outros meios (prostituição ou estupro por exemplo) não se pode explorar a falta do genitor. No entanto, onde está a família de Patricia? Os amigos? Onde porventura estão as políticas públicas de planejamento familiar? Esses questionamentos por não são suficientes para ir a cerne da problemática colocada na história de vida de Patricia. Há pois, vários elementos que circulam no universo da sociedade em que ocorreu o caso e uma investigação mais minuciosa pode tratar de uma melhor forma e/ou de forma social a questão .
Para estudar o caso noticiado faz necessário ter do próprio texto as inferências da realidade social da sociedade da época. A primeira que o texto apresenta é que se tratava de uma desempregada. O desemprego é um mal que permeia a sociedade como um todo. Recorrentemente vemos em campanhas políticas a bandeira da criação de vagas no mercado de trabalho ser levantadas pelos candidatos as vagas de diversas esferas de governo, no entanto, efetivamente pouca coisa se faz para mudar a realidade de pessoas como essa que sem trabalho e sem dinheiro foi ao extremo de roubar uma lata de leite para saciar a sua fome. Para compreender melhor a realidade do universo de desemprego das mulheres (já que se trata de uma mulher) partimos da noticia para pontuar as informações básicas e junto a outras fontes aprofundamos nessa realidade.
Como o fato foi noticiado em 2008, na capital do Ceará recorremos aos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE para fazer um levantamento do índice de desemprego de mulheres nessa cidade e encontramos que ser mulher e desempregada era uma marca em quase 80% das mulheres que viviam na região metropolitana de Fortaleza:



Como vemos acima, constatado pelo IBGE em quase 10 anos pouca coisa mudou no mercado de trabalho feminino em Fortaleza e Patricia e outras mulheres, muito provavelmente, tiveram poucas oportunidades nesse período. Então ser mulher e desempregada era uma realidade partilhada pela esmagadora maioria da população feminina em Fortaleza, o que reforça a ideia que se tem não só em fortaleza mas em todo o país: Mulher sofre discriminação para venda de sua mão de obra! Essa ideia é amplamente noticiada pelos meios de comunicação a exemplo disso extraí um trecho do noticiário de 2008 sobre esse assunto. A instituição apresentou um balanço de sua Pesquisa Mensal de Emprego, realizada em seis grandes capitais: Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre. Os dados colhidos entre janeiro de 2003 e janeiro de 2008 revelam que, no campo profissional, as mulheres ainda estão em desvantagem diante dos homens.

Embora sejam a maioria da população adulta brasileira e apresentem níveis crescentes de ocupação, as mulheres têm menor inserção no mercado. Em janeiro deste ano, nas seis regiões metropolitanas pesquisas, havia 21,2 milhões de pessoas trabalhando. Dessas, 9,4 milhões eram mulheres. Ou seja: embora representem 53,5% da população brasileira em idade economicamente ativa, elas ocupam somente 44,4% dos postos de trabalho. Já no quesito desemprego, por exemplo, elas são maioria. Entre o total de desempregados nas regiões metropolitanas pesquisadas, há 1 milhão de mulheres, contra 779 mil homens na mesma situação. (UOL notícias IBGE: no mercado de trabalho, permanece a desigualdade entre homens e mulheres em 07/03/2008 – 10h03).

Evidentemente estar desempregado não justifica o furto mas condiciona os mais desfavorecidos a uma realidade humilhante e constrangedora. Por outro lado vale salientar que a ociosidade advindo da falta de oportunidade pode subjugar a mulher e levá-las ao mundo da exploração sexual que se coloca a porta desta como saída de sua situação de fome e miséria. Nesse mesmo ano (2008) a prefeitura de Fortaleza divulgou um estudo onde mostra o perfil da exploração sexual das crianças e adolescente na cidade. Bem detalhado com gráficos mostrando as diversas facetas dessa exploração o estudo alarma para para a situação grave da prostituição. Ou nas palavras do próprio estudo:

A análise dos dados da situação de exploração sexual de crianças e adolescentes na cidade de Fortaleza mostra-se bastante grave, no que concerne à alta vulnerabilidade em que se encontram estas. Essas crianças entrevistadas na pesquisa, de pouca idade, clamam por atenção, pois se encontram diante de todo tipo de exploração, excluídas do processo escolar, em situação de risco social, até altas horas da noite em estradas, avenidas, sujeitas a todo tipo de violência. (PESQUISA SOBRE A EXPLORAÇÃO SEXUAL INFANTO-JUVENIL NO TURISMO DE FORTALEZA pag. 86 )

Apesar do estudo focar na exploração sexual infanto-juvenil, não deixa de corroborar a ideia que os desfavorecidos são em sua maioria vitimas da truculências de aproveitadores para satisfazer seus desejos sexuais.
Outro ponto a ser explorado nessa análise é fato de, além de desempregada, era gestante. Isso torna a situação grave pois já é uma tarefa difícil a inserção da mulher no mercado de trabalho, estar gravida é um agravante para a contratação de sua mão de obra e segundo o próprio depoimento de presa ninguém lhe dava trabalho. Existem leis que impeçam a discriminação na hora da contratação, como a lei 9.029 que em seu teor proíbe qualquer ato discriminatório no momento da contratação, inclusive a motivado pela gravidez da candidata a vaga. No entanto é evidente que isso não ocorre na prática. Retirei de um ambiente de discussão virtual hospedado na rede mundial de computadores alguns relatos de mulheres que foram descriminadas na sua contratação por estarem gravidas:

Andréia :Pedi demissão para entrar em uma grande empresa. No meu primeiro dia , peguei o relutado que mostrava que eu estava gravida, e no mesmo dia já contei na empresa para evitar problemas futuros. Devo estar com um mês no máximo. Eles não quiseram mais ficar comigo. Resumindo , fiquei sem nenhum emprego. A empresa pode fazer isso? diana ray de araujo :bom. fui contratada por uma empresa, com um mês descobri que estava gravida de dois mes, fui dispensada a empresa ainda não tinha assinado minha carteira. que direito eu teria? (Site Administradores.com- O portal da administração)

Esses relatos -que são gotas num oceano de desrespeito a leis- identificam que, de fato, há uma depreciação em relação a uma candidata a uma vaga de trabalho quando se trata de gestante. E no caso de Patricia fica mais difícil pois no sexto mês de gravidez (na maioria das mulheres) a barriga esta bem saliente dando a perceber sua prenhez. Isso na maioria das vezes torna improvável um contratação.

Sem querer, ainda, justificar a atitude de nossa personagem da vida real, fica incontestável um ato de desespero por parte de uma pessoa que se está nessas condições: ser pobre, desempregada e gravida no sexto mês.

É tarefa, antes de tudo do ser humano e depois, do profissional em assistência social encontrar as razões dos problemas sociais e munido do conhecimento técnico e cientifico apontar as soluções e para tal há alguns caminhos possíveis que tanto remediam como podem evitar situações como essa que não são raras. A primeira, logo adiante, nos remete as teorias psicanalíticas de Freud, depois uma abordagem na teoria do direito e por fim encaminhamentos de políticas públicas.

Segundo Sigmund Freud, o pai da Psicanálise, o comportamento antissocial e a delinquência são decorrentes de um desequilíbrio entre o ego, o superego e o id, as três partes que constituem a personalidade individual. O id, que é a parte mais primitiva da personalidade, “desconhece o julgamento de valores, o bem e o mal, a moralidade” (Freud, 1933, p. 74). As forças do id buscam a satisfação imediata sem tomar conhecimento das circunstâncias da realidade. Funcionam de acordo com o princípio do prazer, preocupadas em reduzir a tensão mediante a busca do prazer e evitando a dor (no caso proposto a fome). Resultado: ele força as regras sociais e comete um crime. Se o nível de tensão é elevado o indivíduo age no sentido de descarregá-lo. No Caso estudado a pretensa mãe teve, segundo a psicanálise de Freud, seu id tencionado ao máximo pois a fome alegada “...E eu com fome, muita fome. Fome de doer meu estômago”(palavras da presa), é a base tencionadora do id de sua personalidade. E numa análise mais cuidadosa perceberemos que seu id pode ser agravado, pois se tratava de uma gestante de 6 meses e nessa altura de gestação já havia uma troca de afeto entre a criança no útero e sua mãe. A mãe com cuidado e instinto materno sabia que passar privação de alimentação implicaria, não só em sua fome, mas também na desnutrição e risco ao seu indefeso filho no ventre. Nota- se que a mãe, a principio, não teve a intenção de permitir que seu id desflorasse num comportamento antissocial, pois em suas palavras tentou negociar com os funcionários da padaria para que lhe dessem o leite, no entanto não obteve exito em sua negociação. Sem mais recursos para evitar a sua fome e em consequência a fome de seu bebê a senhora em questão foi levada pela parte mais primitiva de sua personalidade, ou seja o id, a agir para satisfazer sua dor mais imediata: a fome de doer. Isto implica dizer que seu comportamento, que agora é antissocial, não a condiciona como criminosa de fato pois sua atitude é fruto de um apelo que foge a normalidade de sua vida.
Como afirmei acima o comportamento antissocial é fruto do desiquilíbrio de uma normalidade de comportamento psicossocial que se daria normalmente com a operação do superego que é a parte moral da mente humana e representa os valores da sociedade. Qualquer pessoa, segundo a teoria da Psicanalise, que for colocada em desiquilíbrio psicológico (provocado pela fome por exemplo) terá seu id tensionado provocando uma reação para satisfação imediata de sua dor. Isto não quer dizer que todos são criminosos mas que todos, assim como a mulher gravida que rouba uma lata de leite, estão condicionados psicologicamente a agirem de modo antissocial para responderem ao apelo mais primitivo de vida que é saciar a fome.

Nesse tom de descriminação do ato, existe na doutrina jurídica e na jurisprudência o chamado furto famélico o qual não é considerado crime porque a pessoa age em estado de necessidade: para proteger um bem jurídico mais valioso – sua vida ou a vida de alguém – a pessoa agride um bem jurídico menos valioso – a propriedade de uma outra pessoa. ocorre quando alguém furta para saciar uma necessidade urgente e relevante. É a pessoa que furta para comer pois, se não furtasse, morreria de fome. Pode ser também furto famélico o atendimento de outras necessidades básicas como um remédio para um doente ou um cobertor para quem está com frio ou até roupa para quem está nu. segundo o Promotor de justiça de São Paulo, Rogério Sanches para ser considerado famélico tem que atender as seguintes características : a) que o fato seja praticado para mitigar a fome, b) que se configure a inevitabilidade do comportamento lesivo, c) que a subtração seja de coisa capaz de diretamente contornar a emergência e d) verificar-se a insuficiência dos recursos adquiridos ou impossibilidade de trabalhar. Esse entendimento do promotor tem base na previsão do Código Penal que em seus artigos 23 e 24 colocam a inexistência de crime quando o fato é praticado em determinadas circunstâncias. Ou na letra fria da lei:

Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo. Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. (Código Penal, artigos 23 e 24)

Como se pode evidenciar no fato noticiado o ato envolve todas as características propostas pelo promotor. No item “a” quando se diz que o fato é para se mitigar a fome esta em pleno acordo pois segundo ao relato da autora ela padecia dede fome. No item “b” diz da inevitabilidade, o que se ajusta ao caso pois ainda de posse dos relatos da autora ela tinha uma “fome de doer” o que, inevitavelmente, a levou à subtração do produto para saciar a fome. No item “c” temos o contorno de emergência, isso também é evidenciado pois uma lata de leite não serviria senão para tentar contornar a fome de uma gestante pois mulheres gravidas comem alem do normal para poder suprir não só seu corpo mas também nutrir a criança que gera em seu ventre. Finalmente, no item “d” é colocado a insuficiência de recursos o que está bem visível na notícia porque ela não conseguia trabalho por esta grávida na tentativa de negociar a aquisição da lata de leite percebe-se que ela não possuía recursos para pagamento do alimento. Há outras duas características do furto famélico que não esta elencada acima mas que é relevante citar. Primeiro: Não se subtrai alimentos com fins de obter vantagem econômica. O que por razões obvias se demonstra nesse caso (uma lata de leite não daria para proporcionar vantagem econômica). E segundo Princípio da insignificância bagatela, segundo o qual para que uma conduta seja considerada criminosa, pelo menos em um primeiro momento, é preciso que se faça, além do juízo de tipicidade formal (a adequação do fato ao tipo descrito em lei), também o juízo de tipicidade material, isto é, a verificação da ocorrência do pressuposto básico da incidência da lei penal, ou seja, a lesão significativa a bens jurídicos relevantes da sociedade. Nesse caso até o depoimento do delegado corrobora para tal entendimento desse caso. Nas palavras do delegado: “....
Ainda há de se falar de uma doutrina jurídica do jurista argentino Eugenio Raúl Zaffaron chamada de tipicidade conglobante na qual o que é permitido ou fomentado por uma norma não pode estar proibido por outra. No texto mais explicativo o site Wikipédia discorre:

Existem situações que o Estado exige ou fomenta determinadas condutas, e, quando o agente pratica essas condutas não há que se falar em antinormatividade do fato, ocasionando sua atipicidade. Na hipótese do Estado exigir a prática de determinada conduta e o agente obedecer esse comando, cometerá um fato atípico, em razão da ausência da antinormatividade, ainda que sua conduta se enquadre perfeitamente dentro do tipo penal. Seria incoerente o Estado exigir a prática de determinado fato e em outro momento determinar a tipicidade desse fato.(http://pt.wikipedia.org/wiki/Tipicidade_conglobante )

Para elucidar melhor essa teoria o próprio site coloca uma situação de antinormatividade: um pai no uso de poder familiar, que é previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente, castiga seu filho trancando em um quarto, isso teoricamente seria um crime de cárcere privado. Mas devido o Estado fomentar que é dever dos pais educar seu filho exercendo o poder familiar a tipicidade da conduta criminosa é tirada em razão da antinormatividade. Ou seja, não há crime pois o pai agiu em nome do poder de família. Outro caso é o do policial que revida num tiroteio e leva seu oponente a óbito. Nesse caso não houve a ilicitude pois o policial tinha um dever legal de rechaçar o criminoso armado.

No caso do furto da lata de leite não se pode deixar de ver que a desempregada agiu pensando em tratar seu filho no ventre, pois observa-se que a responsabilidade de mãe em relação ao futuro filho ou filha traduziu-se na necessidade de alimentar-se. É de conhecimento de todos que uma gestante não pode deixar de alimentar-se pois isso implica na desnutrição de seu bebê. Podemos então ver que o poder de família foi contemplado pela mãe ao tentar subtrair o leite para dar nutrição a seu filho, que estava indefeso e a margem do perigo causado pela falta de alimento materno. Portanto, não houve um crime pois nesse sentido pesa a falta da antinormatividade tipificando o ato da mão como criminosos.

Evidentemente a esses apontamentos que são postos acima são remédios de caráter emergencial (no caso da presa), pois muito mais que inocentar o ato é preciso debruçar sobre as questões de cunho moral, social, filosófico e até cientifico que a situação nos impõe, e procurar através dessas reflexões atingir a cerne da problemática exposta e propor soluções tanto para tratar o caso e evitar que isso se repita. É inadmissível para a sociedade brasileira, tão diversa, tão generosa e num país com uma fartura grande, que casos como esse aconteçam.

Estar gravida não é sinônimo de caos social, tão pouco é o motivo do furto, mas é importante ressaltar que existem condições, na sociedade atual, em que uma gestação se desenvolverá melhor. Como se evidenciou, no caso de Patricia a gravidez estava num momento frágil para mãe e para o bebê.

Existe, na vida de Patricia, uma desestruturação social quando vemos que ela é gestante e não tem as minimas condições de sustentar a gestação, e isso do ponto mais básico que seria uma boa nutrição para a mãe e criança no ventre. Como já foi afirmado acima é não se sabe a origem da gravidez de Patricia mas é importante considerar que essa gravidez, pelo menos nesse momento, poderia ser evitada. Um caminho possível para evitar esse tipo de situação seria Patricia ter uma orientação sobre planejamento familiar. Segundo a cartilha do Ministério da saúde que o Governo Federal lançou a público em 2010 planejamento familiar é uma necessidade dos tempos modernos. E essa necessidade de planejar já era uma preocupação do Governo Federal publicou que em 1996 a Lei nº 9.263, que trata do planejamento familiar. Nessa lei consta que o Sistema Único de Saúde- SUS, é responsável por garantir a a assistência à concepção e contracepção, ou como reza a lei:

Art. 3º O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde. Parágrafo único - As instâncias gestoras do Sistema Único de Saúde, em todos os seus níveis, na prestação das ações previstas no caput, obrigam-se a garantir, em toda a sua rede de serviços, no que respeita a atenção à mulher, ao homem ou ao casal, programa de atenção integral à saúde, em todos os seus ciclos vitais, que inclua, como atividades básicas, entre outras:I - a assistência à concepção e contracepção; II - o atendimento pré-natal; III - a assistência ao parto, ao puerpério e ao neonato; IV - o controle das doenças sexualmente transmissíveis;V - o controle e prevenção do câncer cérvico-uterino, do câncer de mama e do câncer de pênis. (Lei nº 9.263 artigo 3°)

Os serviços de saúde prestados em todas esferas do governo devem estar preparados para acolher a mulher ou o casal com informações e com meios para e também oferecer para essas mulheres pelo menos uma consulta médica e de enfermagem ao ano, mesmo depois que o método esteja em uso, para que ver se é adequado ou procurar outro método. Patricia certamente deveria receber por parte do SUS a assistência correta para evitar sua gravidez nesse momento desempregada e sem recursos para sua subsistência. Em outra palavras, seria bom que sua gravidez se desse em um momento em que tivesse trabalhando e pudesse garantir para ela e o bebê uma maternidade digna.

Como fome e miséria estão relacionados ao caso vamos entender como se posiciona governo brasileiro em relação a essas mazelas sociais.

A fome e a miséria são estudadas para o planejamento de políticas públicas no Brasil, no entanto o que fazer quando de fato não há á efetivação dessas políticas? Cabe ao estado a assistencialização dos direitos fundamentais de sobrevivência. Quando ameaçados, no caso de Patricia vemos que seu direito á uma alimentação digna conforme (o Artigo 6° da CF, direitos sociais da constituição) foi transgredido. De fato,há leis para ampará-la e lhe garantir uma melhor condição de vida, pelo menos é esse o intuito do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS) quando, em sua pagina oficial na internet, diz:

têm por objetivo garantir aos cidadãos em insegurança alimentar e nutricional o acesso aos alimentos e à água em quantidade, qualidade e regularidade suficientes, desenvolvendo, para tanto, iniciativas estruturantes e emergenciais por meio de programas e projetos de apoio à produção, distribuição e consumo de alimentos. (Retirado do site oficial do MDS <http://www.mds.gov.br/segurancaalimentar >)

A atuação do MDS s
egue as diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional(PNSAN), definidas pela Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e dispostas no Decreto nº 7.272, de 25 de agosto de 2010. A coordenação intersetorial e o monitoramento da PNSAN são responsabilidades da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional(Caisan), órgão integrante do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), também composto pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea)”.São leis muito boas, no entanto se mostram falhas pela falta da efetivação das mesmas. Sabendo pois da debilidade da concretização das normas jurídicas em questão, o Estado designa o Assistente Social para que essas leis possam ser materializadas, visto que à área de assistencialização busca basicamente fazer com que esses direitos sejam efetuados, visto que temos as entidades de atendimento e as de defesa e garantia de direitos cuja função é: As entidades de atendimento são aquelas que prestam serviços, executam programas ou projetos e concedem benefícios de prestação social básica ou especial, dirigidos às famílias e indivíduos em situações de vulnerabilidade ou risco social e pessoal, conforme Resolução CNAS nº 109/2005, Resolução CNAS nº 33/2011 e Resolução CNAS nº 34/2011. As entidades de defesa e garantia de direitos prestam serviços e executam programas e projetos voltados prioritariamente para a defesa e efetivação dos direitos socioassistenciais, construção de novos direitos, promoção da cidadania, enfrentamento das desigualdades sociais, articulação com órgãos públicos de defesa de direitos, dirigidos ao público da política de assistência social, conforme Resolução CNAS nº 27/2011.(fonte: http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/entidades-de-assistencia-social).


Sabendo pois que Patricia é desamparada na forma da lei ou da constituição, é dever do Estado promover a sua assistência, fazendo com que o corpo de leis, citados acima, sejam de fato, efetivados em casos semelhantes, casos estes que são comum se ver na sociedade brasileira. Mas o que se observa é que parece existir dois mundos diferentes: um onde muitas leis, teorias, políticas públicas existem e se multiplicam, mas sem utilidade e outro onde Patrícias e outros desfavorecidos vivem e se multiplicam e também são inúteis. Lidar com essas questões não é um caminho fácil pois, no Brasil sobra casos tão drásticos como esse de se roubar por fome. Porém urge por parte de todos os setores da sociedade brasileira refletir sobre as questões que são levantadas e encontrar caminhos para evitar que casos como o estudado chegue ao seu ponto mais extremo e a humanização do ser humano deixe de ser lei , política pública, ideologia, etc e passe a ser na prática nas vidas de todas as vítimas dos efeitos dessa sociedade, que pelo menos agora, parece desumanizada.

Diante dos argumentos expostos tentamos compreender os motivos que levam ao roubo e verificamos que há muita coisa por traz diante de um fato que se eleva e choca a sociedade. Esperar dias melhores pra sempre como na musica citada no inicio do estudo deste caso é um exercício continuo e que não tem fim pois desde sempre os problemas sociais estarão incrustados em nossa sociedade.

Referencia:

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CÓDIGO PENAL. Decreto lei 2.848 . Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm > Acessado em 21 de ago. 2012.

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GOMES, Luiz Flávio. Desempregado e furto famélico. Disponível em <http://lfg.jusbrasil.com.br/noticias/2173226/desempregado-e-furto-famelico >. Acessado em 20/08/2012.
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SUPEREGO. In: WIKIPÉDIA, a enciclopédia livre. Flórida: Wikimedia Foundation, 2012. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/w/index.php?title=Superego&oldid=31635053>. Acesso em: 20 ago. 2012.
UOL: No mercado de trabalho, permanece a desigualdade entre homens e mulheres. Disponível em <http://noticias.uol.com.br/ultnot/2008/03/07/ult23u1398.jhtm >.Acesso em 21 de ago. 2012.

PREFITURA DE FORTALEZA. PESQUISA SOBRE A EXPLORAÇÃO SEXUAL INFANTO-JUVENIL NO TURISMO DE FORTALEZA. Disponível em <http://www.turismo.gov.br/export/sites/default/turismo/programas_acoes/programa_sustentavel_infancia/downloads_tsi/Pesquisa_SetFOR.pdf> . Acesso em 24 de ago. 2012.